Livros infantis que refletem a esperança de crianças em situação de refúgio
Desde cedo, a arte e a cultura podem ser grandes aliadas no combate à xenofobia
Oiê!
Jéssica Moreira aqui. Sou jornalista e escritora. Mayara me convidou para tocar a Carambola dessa semana 😉
Nesta terça, 20/6, é o Dia Mundial do Refugiado e o tema da campanha internacional é “Esperança longe de casa: por um mundo inclusivo com as pessoas refugiadas” e precisamos urgente conversar sobre caminhos para a real integração dessas crianças em todos os espaços de nossa sociedade.
Migrar: deslocar-se, mudar. Em todo o mundo, esse verbo é vivido por milhares de pessoas. Diante de guerras, tragédias ambientais e conflitos internos, essas pessoas não têm outra escolha senão deixar seu lugar de origem e construir recomeços em outros territórios.
Dos 35,3 milhões de refugiados até o fim de 2022, 75.727 estavam no Brasil. Desses, pelo menos 40% são crianças. Seja na escola ou nas comunidades onde estão inseridas, crianças e adolescentes refugiadas devem ter todos seus direitos assegurados e encontrarem aqui a segurança e acolhimento que precisam para crescer bem.
Entre 2016 e 2017, fui articuladora de um projeto que fomentava a integração de crianças imigrantes na região central de São Paulo. Durante esses quase dois anos, aprendemos muito com cada pessoa e a cultura que trazia de seu país. Posso dizer que aprendemos brincando ao relembrar junto aos pais imigrantes as memórias de suas infâncias bolivianas, peruanas, chinesas, sírias. Fizemos isso utilizando também a gastronomia, resgatando as memórias dos almoços de domingo. Isso tudo resultou em muitos materiais, tais como o livro "Sabores e Saberes: memórias que atravessam tempos e espaços" e também vídeos-documentários que podem ser utilizados por todo mundo que tem o interesse de apoiar essa causa.
Essa experiência me fez entender que as ações devem ser muitas, e em conjunto. A inserção de ensino bilíngue na grade curricular, o respeito às diversas culturas e a promoção de trocas culturais são algumas delas. Políticas públicas que considerem o apoio irrestrito a quem chega ao nosso país. Mas não só. É imprescindível que haja o combate à xenofobia desde cedo e a arte e cultura podem ser grandes aliadas nesse processo.
Por isso, indico aqui alguns livros infantojuvenis que refletem os anseios, angústias e esperança de crianças em situação de refúgio. Como diria a narradora de "Um lençol de infinitos fios" (Susana Ventura, Editora Gaivota): "Quem pode dizer dos percursos das gentes? Mudando, estamos sempre mudando, ou por fora, em percursos que inventamos para alcançar nossos sonhos, ou por dentro, em caminhos que são de cada um de nós".
📚Um Lençol de Infinitos fios (Susana Ventura, Ed.Gaivota)
Maria, uma garota boliviana, vive na cidade de São Paulo. Seu sonho é ser escritora e por isso sempre escreve seus pensamentos em um caderno. Na biblioteca com seus amigos, encontra Ludmi, uma jovem haitiana que está em busca de seu pai. Todo o livro traz diversas reflexões sobre como a troca cultural é importante para crianças e adolescentes. Destaco esse trecho muito bonito em que Ludmi se compara a uma borboleta:
"Meu nome é Ludmi Greta Diaphana Beaumont de Sousa e sou do Haiti. Vim de Porto Príncipe e cheguei a Rio Branco com a minha vizinha Mireille (...). Nossos vizinhos mais queridos -- "nosso lençol" -- morreram no terremoto de 2010 (...) Há dias voei pela primeira vez: de Porto Príncipe a Quito. E acho que fiz o caminho contrário de uma borboleta, porque parece que me arrasto de terra em terra, por horas, enquanto ela, uma vez deixado seu casulo, voa em liberdade total.
📚O Quintal de Aladim (Ed.Paulus, Andréa Avelar)
A história de um garoto sírio que chega no Brasil e busca aqui um recomeço junto à sua família. "Quando fecho meus olhos, posso sentir o cheiro do meu quintal. Houve um tempo em que meus passos eram tão pequenos que meu quintal parecia gigante (..) A palavra “refugiados” saiu da boca do meu pai com uma tristeza acompanhada de um olhar de esperança. Eu gostei de ouvir. Nós não sabíamos o que era um refugiado, mas ele nos ensinou, porque, a partir daquele dia, cada um de nós seria um”.
📚Dois meninos de Kakuma (Marie Ange Bordas, Ed. Pulo do Gato)
“Não quero viver em Kakuma para sempre. Quero crescer e ser dono da minha vida, ter liberdade para escrever minha história em outros lugares. Eu sou Geedi, aquele que nasceu em movimento”, é um dos trechos do livro “Dois meninos de Kakuma”, que retrata a vida de duas crianças: Geedi e Deng. Os garotos vivem no Campo de refugiados de Kakuma, no Quênia, que existe desde 1992. Com foto-ilustrações dos dois protagonistas-- Geedi nascido no campo e Deng que veio sozinho do Sudão -- o livro nos leva a entender um pouco do cotidiano, passado, sonhos, afetos e inquietações das infâncias nesse espaço.
Espero que você e sua criança encontrem nessas histórias um pouco de si mesmos.
Obrigada pela leitura!
Até a próxima
Li um lindo com meus filhos, que se chama "A Viagem"